Estamos usando as redes sociais para fugir de encarar a realidade?

Fabiano F.

autoconfiança

É fácil (e viciante) passar horas rolando a tela do celular em busca do próximo vídeo engraçado, da receita que nunca vamos cozinhar, da notícia ultrajante, da dancinha sensual ou da polêmica do momento.

É fácil se recostar no sofá (ou ainda de manhã na cama) e se distrair, seja com a vida perfeita de quem parece ter tempo de sobra, seja com o ódio destilado por quem confunde liberdade de expressão com agressividade gratuita.

As redes sociais dão palco para tudo. E esse “tudo”, infelizmente, inclui distrações suficientes para nos afastar da nossa própria realidade. Projetadas para oferecer prazer imediato sem esforço, essas plataformas funcionam como válvulas de escape, perfeitas para evitar o desconforto de encarar um mundo real, imperfeito e desafiador.

Como espectadores passivos (porque curtidas e comentários são formas rasas de interação), perdemos horas valiosas assistindo à vida alheia, que insiste em parecer mais interessante e bem-sucedida do que a nossa.

Enquanto isso, deixamos de investir nas relações reais, aquelas feitas de alegrias verdadeiras, mas também de frustrações, desencontros e imperfeições. Fotos, vídeos e conteúdos efêmeros nos afastam das nossas obrigações, e essa atenção constante ao que pouco agrega só aprofunda a procrastinação, tornando problemas simples em dilemas complexos.

Ao checar compulsivamente as redes sociais, adiamos conversas difíceis, ignoramos nossa família, deixamos de ler o livro que poderia ampliar nosso olhar, ou negligenciamos tarefas simples como organizar a papelada acumulada nas gavetas.

Ao entregar gratuitamente nossa atenção às plataformas digitais, perdemos o contato com o mundo ao nosso redor: deixamos de caminhar ao ar livre, de pedalar por prazer, de ligar para um parente querido ou mesmo de ficar em silêncio – algo essencial para um cérebro saturado de estímulos.

Cada vez que pulamos de reel em reel, de story em story, abrimos mão de viver momentos concretos. Nossas memórias tornam-se escassas e nossas histórias, cada vez mais etéreas, quase sem base em experiências reais.

Felizmente, cresce o número de pessoas repensando sua relação com o consumo digital. Só o ato de separar o joio do trigo já é um começo. Somar a isso a consciência sobre o tempo de tela e o tipo de conteúdo consumido é outro passo essencial.

Não se trata de demonizar as redes sociais ou baní-las das nossas vidas. Trata-se de refletir sobre o lugar que elas ocupam no nosso cotidiano, o tempo dedicado a elas e, principalmente, o impacto emocional e mental do que escolhemos assistir.

Está mais do que na hora de gerenciar o tempo e o espaço mental que oferecemos ao mundo virtual. Só assim conseguiremos preservar nossa saúde emocional, viver o presente com mais intenção e assumir, de fato, nosso papel humano em uma sociedade que continua a precisar de afeto, escuta e presença (qualidades que só uma pessoa real pode oferecer).

Talvez o caminho esteja em pequenas mudanças cotidianas: observar com mais atenção onde colocamos nosso olhar, escolher com mais intenção o que consumimos e, principalmente, lembrar que a vida que importa é a que acontece fora das telas.

Que possamos retomar, aos poucos, o hábito de estar presentes (com os outros e com a gente mesmo), valorizando o que é vivido de verdade. O mundo digital pode entreter, informar e até inspirar, mas ele nunca deve substituir a experiência sensível, concreta e imperfeita de estar vivo. É nessa vivência (feita de altos e baixos) que construímos sentido, pertencimento e memória. E isso nenhuma rolagem infinita é capaz de oferecer.

 

Fabiano F. é jornalista e autor de livros de autodesenvolvimento, como “Agora Vai” e “Enfrente”.

Siga-o no Instagram: @fabianoautor

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