Metanol em destilados expõe falhas na fiscalização das bebidas

Andre Cesar

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Quando a gente acha que já viu de tudo em matéria de golpe e engano, o crime encontra novas formas de surpreender. O recente escândalo das bebidas contaminadas com metanol sacudiu o país e revelou uma nova faceta dos riscos sanitários em bares, restaurantes, festas e casas de eventos. Desta vez, não se trata apenas de produtos duvidosos do comércio informal. Foram bebidas servidas em estabelecimentos conhecidos, resultando em mortes, episódios de cegueira e dezenas de casos graves de intoxicação confirmados pelas autoridades de saúde.

As investigações apontam duas rotas principais para o metanol chegar ao copo do consumidor. De um lado, há suspeitas do envolvimento de grupos especializados em falsificar bebidas, utilizando rótulos sofisticados e reaproveitando garrafas para lucrar com produtos adulterados. De outro, ganhou força a hipótese do uso inadequado de metanol no processo de lavagem de garrafas, quando resíduos do produto não são completamente eliminados e acabam contaminando o destilado.

A apuração revelou um esquema amplo. Bares e restaurantes vendem garrafas vazias para empresas clandestinas, que as enchem novamente com falsificações e as revendem, muitas vezes, para os próprios estabelecimentos de origem. Essa engrenagem movimenta grandes volumes e mostra que não se trata de episódios isolados, mas de um sistema estruturado que envolve atravessadores, fabricantes irregulares e comerciantes coniventes.

O caso também reacendeu o debate político. Veio à tona uma flexibilização promovida ainda no governo Temer, em 2017, que acabou com a fiscalização externa obrigatória das bebidas e concentrou o controle nos próprios produtores. Agora, diante do aumento dos casos e da pressão de entidades de saúde e do setor, parlamentares se mobilizam para rever a legislação e ampliar as punições para quem fraudar, comercializar irregularmente ou burlar o controle sanitário das bebidas.

Associações de bares, restaurantes, buffets e organizadores de festas manifestaram preocupação com os danos à credibilidade do setor. Muitos estabelecimentos relatam queda nas vendas de destilados, aumento da desconfiança dos clientes e dificuldades nas negociações com fornecedores, em meio a um clima de medo generalizado.

O escândalo trouxe de volta uma verdade incômoda: nossa capacidade de fiscalização ainda é falha e o risco para o consumidor é real. A confiança, elemento vital de qualquer brinde, está abalada. O crime pode até inovar nos métodos, mas só o compromisso de cada elo da cadeia produtiva com transparência e rigor no controle pode proteger quem está do outro lado do balcão. Sem isso, a celebração corre o risco de virar tragédia.