Tarifaço avança, Brasil recalcula a rota

Andre Cesar

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Menos de duas semanas depois de entrar em vigor, o tarifaço imposto por Donald Trump às exportações brasileiras já produz efeitos visíveis — e dolorosos. A sobretaxa de até 50%, anunciada como retaliação comercial, atingiu em cheio parte significativa da pauta de exportações, apesar de acordos de última hora terem poupado setores estratégicos como aviões, suco de laranja, madeira, fertilizantes, ferro-gusa e alguns metais. Fora dessas exceções, o impacto é imediato: cerca de 36% das vendas brasileiras para os Estados Unidos agora pagam a tarifa máxima, elevando custos, derrubando contratos e deixando mercadorias sem comprador.

Empresas do agronegócio e da indústria processadora relatam embarques suspensos e encomendas canceladas. O açaí, que havia conquistado espaço premium no mercado norte-americano, já sofre com excedente de oferta no Brasil e risco de queda de preço. Exportadores de ovos, que vinham de uma recuperação acelerada após o impacto da gripe aviária, temem a perda do segundo maior mercado externo. Para setores intensivos em mão de obra, como frutas frescas e carnes especiais, a ameaça de demissões em cascata deixa de ser projeção para se tornar plano de contingência.

O governo brasileiro reagiu em múltiplas frentes. Acionou a Organização Mundial do Comércio, invocou a Lei da Reciprocidade Comercial recém-aprovada e anunciou linhas de crédito e garantias adicionais para empresas atingidas, além de intensificar negociações com outros mercados — da Ásia ao Mercosul, passando pela União Europeia. Há também um esforço diplomático para ampliar alianças em fóruns como o BRICS e aproximar-se ainda mais da China, numa tentativa de diluir a dependência de um único parceiro.

Nos Estados Unidos, o efeito colateral é previsível: produtos brasileiros chegam mais caros às prateleiras, pressionando a inflação e afetando consumidores e empresas locais que dependem desses insumos. O café especial, por exemplo, já enfrenta reajustes, e carnes importadas do Brasil tendem a seguir o mesmo caminho. A lógica protecionista que embala o tarifaço pode agradar parte do eleitorado de Trump, mas adiciona incerteza a cadeias produtivas integradas e encarece o custo de vida.

Com a agenda de diálogo bilateral travada — a reunião marcada com o secretário do Tesouro norte-americano foi cancelada —, Brasília trabalha no curto prazo para amortecer perdas e, no longo prazo, para reconfigurar sua inserção no comércio global. O desafio não é apenas superar a crise, mas aproveitar a turbulência para acelerar a diversificação de mercados, uma pauta antiga que agora deixou de ser opção para se tornar necessidade urgente.