Volto a escrever de novo sobre a febre amarela porque conforme alertei em coluna anterior, a doença se alastrou por vários estados brasileiros em 2017, causando a morte, só em 2018, de 43 pessoas em  Minas Gerais (17), São Paulo (14) e Rio de Janeiro (12). Quase metade das mortes em Minas Gerais ocorreram na Região Metropolitana de Belo Horizonte; em São Paulo, um pouco mais da metade (8 óbitos) ocorreu no município de Mariporã, localizado a 40 Km da capital.  Além destes estados, a  febre amarela está também causando mortes no Espírito Santo, Brasília, e Bahia. Nesta coluna tratarei de questões que não abordei antes, porque só havia enfocado o controle do mosquito Aedes aegypti.

É sabido há muito tempo no Brasil e no mundo que o principal método de controle de curto prazo de uma epidemia de febre amarela é a vacinação em massa da população urbana para evitar a expansão da doença de áreas silvestres para áreas urbanas. Quando há vacinação em massa, a população adquire imunidade e a febre amarela não se dissemina mais, tanto em áreas urbanas quanto rurais. Nessas, entretanto, pode continuar matando macacos na sua versão silvestre. Para haver vacinação em massa, é óbvio que o Brasil tem que estocar vacinas contra a febre amarela para fazer uso delas quando necessário.

Infelizmente, o que se viu nos últimos meses é que o Ministério da Saúde, atualmente dirigido por um ministro incompetente que tem grande interesse em privatizar serviços de saúde, não conseguiu lidar com a epidemia quando ela se esboçou no inverno de 2017. De lá para cá a situação piorou e as insuficiências estruturais do SUS estão escancaradas para toda a população brasileira.

Por que a população teve que enfrentar enormes filas para se vacinar com um quinto da vacina, também chamada vacinação fracionada, comumente utilizada no país? Por que o Ministério da Saúde não foi capaz de preparar a resposta necessária para uma epidemia que começou em 2017? Por que o Brasil não produziu vacinas contra a febre amarela em quantidade suficiente? A resposta mais curta a estas perguntas é a crônica falta de verbas para o setor de saúde no Brasil durante pelo menos 40 anos e a enorme transferência de recursos para os banqueiros. O governo paga juros estratosféricos para satisfazer a ganância dos bancos e corta recursos essenciais para garantir o bem-estar da população. Portanto, não é surpresa que mais uma epidemia transmitida pelo mesmo mosquito cresceu e apareceu inclusive nos estados mais ricos do país.

O Bio-Manguinhos, laboratório público do Ministério da Saúde faz parte da Fiocruz, no Rio de Janeiro, e exporta milhões de doses da vacina para todo o mundo. Aliás, esse laboratório é o maior produtor de vacinas contra a febre amarela no mundo. O outro fabricante da vacina é o laboratório multinacional Sanofi, que tem sede na França. Segundo reportagem recente do site G1, enquanto a vacina produzida pela Fiocruz custa R$ 3.50 e é distribuída de graça para toda a rede do Sistema Único de Saúde (SUS), a vacina produzida pela Sanofi é vendida por cerca de R$ 150.00 ao setor privado. No momento atual, há falta de ambas, mas quem de fato garante a produção de vacinas é o Bio-Manguinhos, sustentado por verbas federais.

Em tempos normais, se exige vacinação apenas para as pessoas que vivem em áreas onde a febre amarela silvestre ocorre e para turistas que viajam para estas áreas. Havia suficiente produção e estoque de vacinas no Brasil para dar conta desta rotina. Porém, ficou claro desde o ano passado que o Brasil não estava preparado para situações de crise. Aliás, se trata de crise bastante previsível já que o mosquito também transmite os virus da dengue, Zika e chikungunya.

Desde 2003 pesquisadores da Universidade de São Paulo alertaram sobre o perigo da reintrodução da febre amarela em áreas urbanas no estado de São Paulo (http://www.journals.usp.br/rsp/article/view/31618). Portanto, como escrevi antes, é um mosquito muito brasileiro e só com profundas mudanças nas políticas de saúde e no financiamento da saúde pública poderemos prevenir e controlar as epidemias que assolam o país nos últimos anos.